sábado, 27 de março de 2010

Dever do Advogado.

"Eu entrei em um júri perdido, com a defesa destroçada e com a opinião pública querendo me bater"

No intervim de todo o circo montado em volta do julgamento do casal Nardoni, algo me foi salutar, a declaração feita pelo Advogado que coordenou a defesa do casal, o Dr. Roberto Podval por volta do 4° dia de julgamento. Não obstante, o mérito da autoria delitiva dos réus, uma vez que a justiça togada em concurso com juízes constitucionais já o fizeram. Entretanto, algumas questões suscitaram meu senso reflexivo, entre as quais, o papel do Advogado no Estado Democrático de Direito e se alguma causa poderia ser indigna de defesa, do ponto de vista jurídico, óbvia que não, mas me conterei a aspectos éticos.

Cabe-me condensar a dinâmica que levou ao Advogado, agente indispensável na obtenção de uma ordem jurídica justa, colocar em risco sua integridade física, pelo simples fato de cumprir com seu dever e a garantia constitucional dos réus. (Lembrando que por algum surto de comoção, todos os Advogados do Brasil se recusassem a defender o casal, os réus seriam declarados inocentes, pelo princípio da presunção de inocência e a obrigatoriedade de uma defesa técnica) Não vamos adotar um maniqueísmo primário e ingênuo, vendo o arcanjo de um lado e o demônio de outro, mas é muito verdade, que o sensacionalismo promovido pelos meios de comunicação em massa ao desenrolar de todas as fases criminais (investigação, processo e julgamento), municiado pelo clamor público que em nenhum momento emitiu juízo sem paixão, a todos faltava serenidade, que apenas suspirou com o desenrolar do processo e a apresentação das provas. Se isso não fosse o bastante, temos uma sociedade discrente do poder judiciário e um rol de personalidades que se julgam acima da verdade.

Ficou evidenciado ao longo da história que, as massas instigadas por interesses capciosos, produziram, por vezes, injustiças maiores a que visavam repelir, no que pese o Holocausto Nazista, os julgamentos sem direito a defesa para os acusados de conspiradores na Revolução Francesa, e por ai vai.

Pois bem, hoje é entendimento pacifico na doutrina, a inexistência da indefensibilidade de certas causas criminais, sendo assim, sem epiteta-se de amoral a respectiva advocacia, como ainda era sustentada no início do século XX. Nesse sentido, sob o título o Dever do Advogado, o grande jurista Rui Barbosa expôs uma lição de ética profissional, tão eloqüente como irretorquível.

“Ora, quando quer e como quer que se cometa um atentado, a ordem legal se manifesta necessariamente por duas exigências, a acusação e a defesa, das quais a segunda, por mais execrando que seja o delito, não é menos especial a satisfação da moralidade pública do que a primeira. A defesa não quer o panegírico da culpa, ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos seus direitos legais. Se a enormidade da infração reveste caracteres tais que o sentimento geral recue horrorizado, ou se levante contra ela em violenta revolta, nem por isso essa voz deve emudecer. Voz do Direito no meio da paixão pública, tão suscetível de se demasiar, as vezes pela própria exaltação da sua nobreza, tem a missão sagrada, nesses casos, de não consentir que a indignação degenere em ferocidade e a expiação jurídica em extermínio cruel.”

Aquilo que Picard chamou de “o paradoxo do Advogado”; quero dizer, a possibilidade de um homem se conservar honesto e digno, embora defendendo causas más e grandes criminosos, foi em parte respondido pelo ex-ministro da Justiça, Marcio Tomas Bastos, quando respondeu a um questionamento similar ao proposto por Picard dizendo mais ou menos isso; “meu papel como garantidor da justiça é cuidar dos aspectos legais, exaurindo todos os meios possíveis para que satisfaça a pretensão do meu cliente, é disso que cuido. Os aspectos morais são de competência da justiça divina, faço tudo que a lei assim permitir, depois meu cliente que se acerte com Deus” Sem entra no mérito da real existência de uma justiça divina.

Destarte a defesa não é mera garantia do acusado, é um princípio norteador da justiça, pois acima de tudo, Advogar é comprometer-se com o justo, e ser justo, perpassa indubitavelmente por uma ampla defesa, por mais hediondo que possa parecer o delito, ninguém padecerá sem o abrigo da legalidade. Tendo em consonância a afirmação e concretização dos Direitos Humanos.

Assim deixo, Dr. Roberto Podval, seu trabalho em muito nos honra!

2 comentários:

Unknown disse...

Indago-me. Fica os elogios à pessoa do Advogado, ou os elogios servem para ratificar a sua posição contrária à opinião pública, seja ela qual seja?

Manifesto disse...

Os elogios são para a função exercida pelo Advogado, pensando bem, não haveria como ter sido outro o resultado, devo minhas reticências a histórica defesa do Dr. César Ramos, esquecendo que nem sempre, os jurados precisam de um timoneiro. =D