Um dos mais apaixonantes e instigantes debates no âmbito da Filosofia do Direito encontra ensejo nos fundamentos do Direito, sob quais argumentos se edificam a legitimidade da obediência as normas jurídicas? Existe uma força fundante para tais normas?
Iremos nos ater aos chamados Direitos do homem, no qual o brilhante júris - filosofo, Norberto Bobbio, dissertou na primeira parte do livro, A era dos Direitos.
Pois bem, como almejam os jusnaturalistas, os Direitos do homem, gozam da prerrogativa de possuírem fundamentos absolutos, dessa forma, partimos do pressuposto de que os Direitos Humanos são coisas desejáveis, isto é, fins que merecem ser perseguidos, e de que, apesar de sua desejabilidade, não foram ainda todos eles (por toda parte e em igual medida) reconhecidos; e estamos convencidos de que lhes encontrar um fundamento, ou seja, aduzir motivos para justificar a escolha que fizemos e que gostaríamos fosse feita também pelos outros, é um meio adequado para obter para eles um mais amplo reconhecimento.
Como assevera Bobbio, da finalidade visada pela busca do fundamento, nasce à ilusão do fundamento absoluto. Tal ilusão foi defendida durante séculos pelos jusnaturalistas, que supunha ter colocado certos direitos (mas nem sempre os mesmos) acima da possibilidade de qualquer refutação, derivando-os diretamente da natureza do homem. Porém a natureza do homem revelou-se muito frágil como fundamento absoluto de direitos irresistíveis.
Kant havia racionalmente reduzido os direitos irresistíveis (que ele chamava de “inatos”) a apenas um: a liberdade.
Essa ilusão já não é possível hoje; toda busca do fundamento absoluto é, por sua vez, infundada, haja vista, a priori que Direitos do homem é uma expressão muito vaga. Certamente a parte majoritária vai aduzi no sentido de que, “Direitos do homem são aqueles cujo reconhecimento é condição necessária para o aperfeiçoamento da pessoa humana, ou para o desenvolvimento da civilização, etc., etc.” ainda assim, continuamos com uma roda quadrada. Afinal o que vem a ser aperfeiçoamento da pessoa humana ou desenvolvimento da civilização? Decerto, teremos que socorrer nossas posições em; opções políticas, preferências pessoais e orientações ideológicas. O que torna evidente a falta de objetivismo para delimitar o aludido conceito.
Prosseguindo o raciocínio, Bobbio salienta, os direitos do homem constituem uma classe variável, como a história destes últimos séculos demonstra suficientemente. Direitos outrora tidos como absolutos, podem mais tarde ser relativizados, em vistas do caráter dinâmico das relações sociais e jurídicas. No que pese, ser tal relativismo a chave e o mais forte argumento em favor de alguns direitos do homem. Pressuponho que, acreditar na unicidade de visão de mundo não é, nem pode ser, um dos pressupostos dos Direitos do homem, exemplo; consagrar a liberdade religiosa, é respeitar o que o homem possui de mais peculiar, sua individualidade, dessa maneira o indídiduo professe a fé que melhor atenda seus anseios de vida, e até não professar fé alguma.
Além do mais, a classe de Direitos do homem é também heterogênea. Havendo, razões que valem para sustentar umas não valem para sustentar outras. Nesse caso, não se deveria falar de fundamento, mas de fundamentos dos direitos do homem, de diversos fundamentos conforme o direito cujas boas razões se desejam defender. Alguns direitos limitam ou inviabilizam outros direitos, vejamos, o direito de não ser escravizado, implica inexoravelmente, na falta de direito de não possuir escravos. Não ser torturado, na mesma tese, implica em não praticar tortura, e assim por diante. Lembrando que, quase sempre, não se faz pertinente defender o direito a liberdade, no mesmo sustentáculo que se advoga o direito de propriedade. Direitos distintos, requerem bases axiológicas distintas. Portanto, sobre esse ponto, parece que temos que concluir que direitos que tem eficácia tão diversa não podem ter o mesmo fundamento, basta olharmos para as diferentes dimensões que os doutrinadores atribuem aos Direitos Humanos, cada qual necessitando de prerrogativas distintas. Olhem as obrigações negativas do Estado na primeira dimensão e a obrigação positiva do Estado da segunda.
Destarte, o fundamento absoluto defendido não é apenas uma ilusão; em alguns casos, é também um pretexto para defender posições conservadoras. O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político.
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